Será que a dimensão psicológica é suficiente para dar conta das questões da arte?
Uma coincidência (se é que isso existe) fez com que, na semana em que dedicamos o quadro Lavra da palavra à poeta Florbela Espanca, estivesse em cartaz, na cidade de São Paulo, um filme português que se pretende uma cinebiografia da poeta. Com o pormenor de que o diretor Vicente Alves do Ó centrou a trama nas angústias, desejos e paixões de Florbela, sua ambígua relação com o irmão, a dor quando este morreu subitamente num desastre aéreo, enfim, naquilo que podemos chamar de um quadro "psicológico" da personagem.
Entretanto, no filme não se ouve sequer um poema... O que nos lembrou um comentário ouvido a respeito do filme Tróia, com um hipertrofiado Brad Pitt no papel de Aquiles, mas sem qualquer menção a Apolo, Atena, Marte, enfim, os Olímpicos. O comentário em questão dizia: tentar contar a história da Ilíada sem os deuses é mais ou menos como contar um conto de fadas... Sem as fadas. E da mesma forma, tentar contar a história de Florbela sem os versos.
E a razão por trás disso é uma tendência amplamente difundida na arte e nos meios culturais, qual seja à de remeter à esfera da "psicologia" o foco das narrativas. O resultado pífio de Florbela, o filme, é apenas mais um indício das insuficiências da ciência (se de ciência se trata) psicológica. O tema é muito amplo para ser tratado aqui para além de uma menção, mas voltaremos a ele, pois grande parte da busca artística atual talvez seja a da procura de um outro viés para o sentimento do mundo e da vida. Quem sabe dispensando o repertório de "complexos de Édipo", "vontades de castração" e outras idiossincrasias do dicionário freudiano.
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