Rubén Darío (1867 - 1916)
O poeta nicaraguense Rubén Darío é um famoso autor modernista da língua espanhola, mas tal definição respeita mais a cronologia do que seu estilo. Pois a voz ancestral da Musa de Darío é evidente, e seus versos levam amiúde ao arcaico, ao sagrado, ao mágico. Tomemos como exemplo seu poema Ano Novo. O personagem inicial é um santo do século IV, o 33º papa, São Silvestre, nascido no ano 285 e morto em 31 de dezembro de 335. Sua aparição, no poema, é iluminada pelas estrelas de Dezembro e pelo signo de Sagitário, o Arqueiro. E os versos aludem sutilmente à tradição dos Solstícios que, como pontos culminantes da trajetória anual da Terra pelo zodíaco, eram chamados Porta dos Deuses e Porta dos Homens. Seria pela “porta” do Solstício de Dezembro, conforme o saber antigo, que as almas dos mortos sairiam da esfera terrestre. Rubén Darío articula tudo isso, em magníficas imagens barrocas neste poema Ano Novo que ouviremos a seguir em tradução deste apresentador.
Rubén Darío
Ano Novo
A las doce de la noche, por las puertas de la gloria y al fulgor de perla y oro de una luz extraterrestre, sale en hombros de cuatro ángeles, y en su silla gestatoria, San Silvestre.Más hermoso que un rey mago, lleva puesta la tiara, de que son bellos diamantes Sirio, Arturo y Orión; y el anillo de su diestra hecho cual si fuese para Salomón. Sus pies cubren los joyeles de la Osa adamantina, y su capa raras piedras de una ilustre Visapur; y colgada sobre el pecho resplandece la divina Cruz del Sur. Va el pontífice hacia Oriente; ¿va a encontrar el áureo barco donde al brillo de la aurora viene en triunfo el rey Enero? Ya la aljaba de Diciembre se fue toda por el arco del Arquero. A la orilla del abismo misterioso de lo Eterno el inmenso Sagitario no se cansa de flechar; le sustenta el frío Polo, lo corona el blanco Invierno y le cubre los riñones el vellón azul del mar. Cada flecha que dispara, cada flecha es una hora; doce aljabas cada año para él trae el rey Enero; en la sombra se destaca la figura vencedora del Arquero. Al redor de la figura del gigante se oye el vuelo misterioso y fugitivo de las almas que se van, y el ruido con que pasa por la bóveda del cielo con sus alas membranosas el murciélago Satán. San Silvestre, bajo el palio de un zodíaco de virtudes, del celeste Vaticano se detiene en los umbrales mientras himnos y motetes canta un coro de laúdes inmortales. Reza el santo y pontifica y al mirar que viene el barco donde en triunfo llega Enero, ante Dios bendice al mundo y su brazo abarca el arco y el Arquero.
Quando bate a meia noite, d’ouro e pérola o fulgor, do portal da sua glória e com luz extraterrestre, sai levado a quatro anjos, no assento sobre o andor, São Silvestre. Mais formoso que um rei mago, leva à testa a tiara, da qual Sirius, Órion, Arcturus, os diamantes belos são; e o anel na sua direita feito qual se fosse para Salomão. A cobrir-lhe os pés as gemas, lá da Ursa adamantina, e na capa pedrarias de Visapur ou o ouro de Cabul; e pendente sobre o peito resplandece a divina Cruz do Sul. Ruma o papa para o Oriente; vai em busca do áureo barco onde em brilhos de aurora vem triunfante o rei Janeiro? Já a aljava de Dezembro foi-se toda pelo arco do Arqueiro. E na orla do abismo misterioso do Eterno o imenso Sagitário não se cansa de flechar; o sustenta o frio Polo, o coroa o branco Inverno e a cingir seus rins está o azul manto do mar. Cada flecha que dispara, cada flecha é uma hora; doze aljavas cada ano traz a ele o rei Janeiro; e na sombra se destaca a figura vencedora do Arqueiro. Ao redor de tal gigante já se ouve em carrossel voo de almas fugitivas ao mistério num afã e o ruído com que passa pela abóbada do céu com suas asas membranosas o morcego que é Satã. São Silvestre, sob o pálio de um zodíaco de virtudes, do celeste Vaticano se detém junto aos umbrais onde hinos e motetos canta um coro de alaúdes imortais. Reza o santo e pontifica e ao ver chegar o barco que triunfante traz Janeiro, ante Deus bendiz o mundo e seu braço abarca o arco e o Arqueiro.
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