Raimundo Correia (1859 – 1911)
Um dos grandes prazeres que um poeta parnasiano como Raimundo Correia pode proporcionar numa época de ignorância generalizada, onde os méritos artísticos foram invertidos, relaciona-se à Memória em seu sentido mais profundo. Na mitologia, ou melhor, na tradição do conhecimento helênico, o Monte Parnaso, no centro da Grécia, era uma das residências de Apolo e das Nove Musas, e até hoje se veem ali as ruínas da antiga Delfos, a cidade sagrada que abrigava a Pitonisa, isto é, o oráculo apolíneo. O nome da montanha inspirou o parnasianismo, surgido na França em meados do século XIX, como tentativa de reação à tendência naturalista-realista hoje dominante, e como recordação profunda sobre a sacralidade do verso, a veneração das formas, a magnificência das palavras. E eis um exemplo perfeito de sua magia: num galope de versos passa pela noite um grupo de cavaleiros. Aproximam-se, atroam na passagem, afastam-se até o retorno do silêncio. De Raimundo Correia, ouçamos uma pequena obra-prima... A Cavalgada.
Raimundo Correia
A Cavalgada
A lua banha a solitária estrada...
Silêncio!... Mas além, confuso e brando,
O som longínquo vem-se aproximando
Do galopar de estranha cavalgada.
São fidalgos que voltam da caçada;
Vêm alegres, vêm rindo, vêm cantando.
E as trompas a soar vão agitando
O remanso da noite embalsamada...
E o bosque estala, move-se, estremece...
Da cavalgada o estrépito que aumenta
Perde-se após no centro da montanha...
E o silêncio outra vez soturno desce...
E límpida, sem mácula, alvacenta
A lua a estrada solitária banha...
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