João Cabral de Melo Neto (1920 – 1999)
Já mencionamos en passant as divergências, sutis a princípio, mais profundas com o passar do tempo, que afastaram, pouco a pouco, dois grandes poetas brasileiros: João Cabral de Melo Neto e Carlos Drummond de Andrade. Os incensadores do modernismo não apreciam tais revelações pois não podem atribuí-las a qualquer incapacidade crítica ou cultural. De fato, não é nenhum recém-chegado da poesia mas o respeitadíssimo João Cabral quem comenta, irônico: “O Carlos Drummond de Andrade ...leu Neruda e desbocou-se, por assim dizer, soltou a língua”. E na contramão, é o respeitadíssimoDrummond quem escreve de Cabral “...excluído todo elemento sensual, proscrita a emotividade romântica... ei-lo rígido, incomunicável... e desinteressado da música, tomba na cacofonia...”Devemos a outro poeta,Affonso Romano de Sant’Anna, a pesquisa que trouxe à luz essas farpas literárias trocadas entre os dois autores, mas vale notar que nem sempre Cabral esteve tão desinteressado assim do “elemento sensual”. Nessas ocasiões, a música, manto natural do amor, reapareceu entre suas linhas. Ouçamos, por exemplo, os pouco lembrados versos do poema Imitação das Águas.
João Cabral de Melo Neto
Imitação das Águas
De flanco sobre o lençol,
paisagem já tão marinha,
a uma onda deitada,
na praia, te parecias.
Uma onda que parava
ou melhor: que se continha;
que contivesse um momento
seu rumor de folhas líquidas.
Uma onda que parava
naquela hora precisa
em que a pálpebra da onda
cai sobre a própria pupila.
Uma onda que parava
ao dobrar-se, interrompida,
que imóvel se interrompesse
no alto de sua crista
e se fizesse montanha
(por horizontal e fixa),
mas que ao se fazer montanha
continuasse água ainda.
Uma onda que guardasse
na pária cama, finita,
a natureza sem fim
do mar de que participa,
e em sua imobilidade,
que precária se adivinha,
o dom de se derramar
que as águas faz femininas
mais o clima de águas fundas,
a intimidade sombria
e certo abraçar completo
que dos líquidos copias.
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