Homero (ca. Sec. VIII A. C.)
A Ilíada, o poema épico atribuído a Homero que narra a guerra dos gregos contra os troianos para resgatar a bela Helena, foi escrita, pelo que se supõe, entre os séculos IX e VIII antes de Cristo, ou seja, há cerca de 2800 anos atrás. É bom ter isso em mente para avaliar a profundidade do conhecimento da alma humana que o autor demonstra, já que, apesar de tão afastado de nós no tempo e no espaço, algumas das cenas que apresenta podem perfeitamente servir de comentários, digamos assim, a episódios recentíssimos. Vejamos, por exemplo, a passagem conhecida desde a Antiguidade como a Epifania de Atena, no Canto I do poema, o chamado Canto da Cólera. O herói da história, o invencível Aquiles, também chamado Pelida, por ser filho do rei Peleu, encontra-se numa terrível discussão com Agamenon, também chamado Atrida, comandante de todos os gregos, que o ofendeu. Não vamos nos estender aqui sobre as razões da ofensa, mas foquemos a cena: Agamenon rejeita com palavras muito rudes as razões de Aquiles que fica furioso a está prestes a desembainhar a espada e matar ali mesmo a seu ofensor. Então a deusa da sabedoria, Palas Atena, desce do céu e aparece, só para Aquiles, o único a vê-la, a fim de que desista de suas intenções. Os comentaristas antigos sempre concordaram sobre o sentido profundo dessa passagem, ou seja, que Homero conhecia, séculos antes de Platão, os três componentes fundamentais, digamos assim, do composto humano: os impulsos básicos, ventrais, instintivos e animalizados; a paixão emocional, em geral manifestada como cólera, ira, agressividade, mas também como coragem, valor e ambição; e a alma superior e imortal, a única capaz de receber a inspiração divina. Ou seja, a cena de Palas Atena que aparece, com olhos terríveis, para iluminar o guerreiro cego de ira era entendida como uma autêntica tese sobre o poder da luz divina oculta no homem. Pode-se até mesmo dizer que Palas Atena é a corporificação daquela luz. E basta refletir sobre vários acontecimentos recentes para perceber como os seres humanos seguem acorrentados aos dois primeiros moventes de seus atos, e distanciados da sabedoria de Palas. E dito isso, relembremos as imortais palavras do poeta inspirado, na Epifania de Atena, no final do Primeiro Canto da Ilíada, pela tradução de Carlos Alberto Nunes.
Homero
Ilíada – Canto I – a Epifania de Atena
tradução de Carlos Alberto Nunes
ὣς φάτο: Πηλεί̈ωνι δ' ἄχος γένετ', ἐν δέ οἱ ἦτορ στήθεσσιν λασίοισι διάνδιχα μερμήριξεν, ἢ ὅ γε φάσγανον ὀξὺ ἐρυσσάμενος παρὰ μηροῦ 190 τοὺς μὲν ἀναστήσειεν, ὃ δ' Ἀτρεί̈δην ἐναρίζοι, ἦε χόλον παύσειεν ἐρητύσειέ τε θυμόν. ἧος ὃ ταῦθ' ὥρμαινε κατὰ φρένα καὶ κατὰ θυμόν, ἕλκετο δ' ἐκ κολεοῖο μέγα ξίφος, ἦλθε δ' Ἀθήνη οὐρανόθεν: πρὸ γὰρ ἧκε θεὰ λευκώλενος Ἥρη 195 ἄμφω ὁμῶς θυμῷ φιλέουσά τε κηδομένη τε: στῆ δ' ὄπιθεν, ξανθῆς δὲ κόμης ἕλε Πηλεί̈ωνα οἴῳ φαινομένη: τῶν δ' ἄλλων οὔ τις ὁρᾶτο: θάμβησεν δ' Ἀχιλεύς, μετὰ δ' ἐτράπετ', αὐτίκα δ' ἔγνω Παλλάδ' Ἀθηναίην: δεινὼ δέ οἱ ὄσσε φάανθεν: |
Enfurecido com essas palavras ficou o Pelida o coração a flutuar, indeciso, no peito veloso, sobre se a espada cortante, ali mesmo, do flanco arrancasse e, dispersando os presentes, o Atrida, desta arte, punisse, ou se o furor procurasse conter, dominando a alma nobre. Enquanto no coração e no espírito assim refletia, e a grande espada de bronze arrancava, do Céu baixou prestes Palas Atena, mandada por Hera, de braços muito alvos, que a ambos prezava e cuidava dos dois por maneira indistinta. Por trás de Aquiles postando-se, os louros cabelos lhe agarra, a ele visível somente; nenhum dos presentes a via. Cheio de espanto, o Pelida virou-se; porém pelo brilho que se lhe expande dos olhos, conhece que é Palas Atena. |
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