Donizete Galvão (1955 - 2014)
“É preciso uma grande generosidade da alma para ser o primeiro a reconhecer que uma obra desconhecida é bela” escreveu Louis Cattiaux no transfigurante livro A Mensagem Reencontrada. Embora a frase tenha implicações muito mais profundas do que parece à primeira vista, também se aplica, por assim dizer, à esfera mundana. O poeta mineiro Donizete Galvão, falecido aos 58 anos, em 2014, não seria um desconhecido, mas é quase. Apesar dos seis livros, do prêmio APCA de 1988, de ter sido finalista do Portugal Telecom, e acima de tudo do talento, a academia e o “stablishment” literário relegaram sua vida a uma margem. Note-se que ele não aplaudiu certos preceitos prestigiados, por exemplo da ideia de “engenheiro do verso” de João Cabral de Melo Neto, e do resto que fosse a isso correlato. Para mais, Donizete Galvão declarou, certa vez que, embora defendesse o rigor e a responsabilidade de decantar as palavras, acreditava no dom, que é um dos termos que escandalizam a ignorância diplomada. Na mesma entrevista, disse que via a origem da poesia como oráculo. Só esta frase basta para colocar um literato em confronto com modernos, pós-modernos e todo o resto dos “ismos”. E agora que sabemos algumas das razões pelas quais esse poeta se destaca na paisagem, ouçamos, de Donizete Galvão, um poema que, como ele mesmo definiu, era o que podia dizer. Chama-se Fiapos, e está dedicado a José Paulo Paes.
Donizete Galvão
Fiapos
Sei que sei
não sei bem o quê.
Saber não revelado,
ainda envolto em
membrana de placenta.
Lembro-me de que preciso
lembrar de uma coisa
que não deveria ser esquecida.
Lembrar de quê?
De um território que se espraia
em sua mudez de azul?
De uma palavra soprada
em tempos de antes de eu nascer,
que na tarefa de viver
caiu no esquecimento?
Num lapso, às vezes,
parece que me lembro
e a lembrança passa
sem que fique registro.
A luz de Apolo
roça minha cabeça
sem que arrebatá-la
eu possa.
Por ela, esmolo.
Rendo sacrifícios.
Ignora-me.
Vai-se embora
com suas chispas.
Ficam fiapos,
cacos, esboços.
Logo, desmemoriado,
quedo-me cego
e abandonado.
O cmais+ é e reúne os canais TV Cultura, UnivespTV, MultiCultura,
TV Rá-Tim-Bum! e as rádios Cultura Brasil e Cultura FM.
Visite o cmais+ e navegue por nossos conteúdos.
Compartilhar
Com curadoria de Joca Reiners Terron, o objetivo é criar narrativas orais de modo itinerante
A exposição conta com Mais de 1600 sobrenomes de descendentes de imigrantes, que foram captados em uma ação interativa em 2019
A cantora e compositora Ceumar realiza show para celebrar o lançamento do disco e os 20 anos de carreira
"DOC.malcriadas", criada e dirigida por Lee Taylor, estreia nesta sexta-feira no Teatro João Caetano. Confira entrevista completa
Na capital paulista, existem diversos desfiles e blocos para aproveitar o feriado
A mudança acontece por conta da junção da galeria com o b_arco Centro Cultural, e conta com a curadoria de Renato De Cara