Contemporâneo de Manuel de Falla e Isaac Albéniz, o espanhol é o compositor do mês em setembro
Há compositores que são invariavelmente citados ao lado de um contemporâneo da mesma nacionalidade nas histórias da música. Dois exemplos que logo vêm à cabeça são os dos alemães Bach e Haendel no século 18; ou dos franceses Ravel e Debussy nas primeiras décadas do século 20. Nenhum outro par, entretanto, é tantas vezes citado lado a lado em toda e qualquer história da música como os espanhóis Isaac Albéniz e Enrique Granados.
Eles mantém muita proximidade e várias afinidades e coincidências. Por exemplo, ambos eram catalães. E nasceram quase ao mesmo tempo. Albéniz em 1860, Granados sete anos depois. Morreram também a pouca distância entre si no tempo: Albéniz em 1909, Granados em 1916. Mais uma afinidade: ambos conquistaram a imortalidade musical por meio de ciclos para piano de características semelhantes. Albéniz com “Iberia”; Granados com as “Goyescas”. Os dois também tentaram a arte lírica – sem sucesso. Notáveis pianistas, Albéniz um tanto melhor que Granados, ambos fizeram do piano profissão como intérpretes.
Enrique Granados é o compositor deste mês por causa de uma efeméride centenária. Foi em 1916, de volta dos Estados Unidos, onde estreara sua ópera “Goyescas” em Nova York, que ele morreu, quando seu navio “Sussex” foi bombardeado por um submarino alemão – a Primeira Guerra Mundial se iniciara dois anos antes, 1914, e se prolongaria a´te 1918.
Estamos, portanto, no ano do centenário de sua morte. Num texto bem-humorado, o antigo crítico do jornal “The New York Times” Harold Schoenberg diz que se Granados não tivesse aceitado o convite do presidente Wilson para tocar na Casa Branca, após a encenação de sua ópera, provavelmente teria vivido muito tempo mais. Por causa do compromisso em Washington, ele cancelou seu retorno à Espanha e remarcou passagem para o navio seguinte, que seria torpedeado pelo submarino alemão. Conta um sobrevivente que o compositor já estava a salvo num bote quando viu sua mulher na água. Saltou para salvá-la e morreram ambos.
Um dos gênios da pintura, o espanhol Francisco de Goya, que viveu no século 18, exerceu um fascínio especial sobre Granados. O compositor dedicou boa parte de suas energias compondo a partir das telas de Goya. Não o Goya satírico, político dos Caprichos. Mas o Goya das Majas e Majos, arquétipos dos amantes radicais. O tema Goyescas engloba não apenas o aclamadíssimo ciclo pianístico de sete peças, mas outras peças isoladas e até a ópera de Granados, assinala o professor Walter Aaron Clark, autor do único estudo de fôlego sobre o compositor, não por acaso intitulado “Granados, poeta do piano”.
“Estou enamorado com a psicologia de Goya, com sua palheta, com ele, com sua musa, a Duquesa da Alba, com suas discussões com seus modelos, suas paixões e adulações. O rosa esmaecido das faces, contrastando com o negro do veludo; aquelas criaturas subterrâneas, mãos de madrepérola e jasmim pousadas em berloques pretos, me possuíram”. São as “majas” misteriosas que Goya retratou – mulheres aristocráticas olhando por sobre os leques, com seus pensamentos secretos, na expressão de Harold Schoenberg. Ao longo deste mês, no Rádio Metrópoli e no Tarde Cultura, de segunda a sexta-feira, vamos revisitar o universo musical deste compositor que tinha Chopin na conta de ídolo máximo, gostava muito de Liszt e conseguiu, em seus melhores momentos, alcançar a delicadeza de Schumann. Tudo salpicado de espanholismos eroticamente refinados.
Como Manuel de Falla e Isaac Albéniz, Enrique Granados estudou com Felipe Pedrell, o pioneiro na pesquisa sistemática da música popular e do folclore deste país de culturas tão diversificadas. Depois foi a Paris estudar com Bériot. Em 1900, de volta para casa, fundou os Concertos clássicos; no ano seguinte a Academia Granados. Excelente pianista, formou com o violinista Jacques Thibaud e o violoncelista também catalão Pablo Casals um trio de sonhos.
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