A grande música de Tom Jobim
Um compositor essencial (e apaixonado pelo Brasil)
Antonio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim (1927, Rio de Janeiro – 1994, Nova York), ou Tom Jobim, como todo o Brasil o conhece desde sempre, era um prato cheio em entrevistas. Rendia muito para os repórteres e a mídia. Sua frase de que a melhor saída para o Brasil era o Galeão ficou famosa. Entre as tantas entrevistas que concedeu ao longo de sua vida, uma certamente é diferenciada.
A entrevista da notável escritora Clarice Lispector realizada em setembro de 1968. Tom estava com 40 anos redondos (completaria 41 em 8 de dezembro). Já tinha conquistado o mundo, primeiro no célebre concerto da bossa nova no Carnegie Hall em NovaYork cinco anos antes, em 1962; e em março de 1967 lançara “Francis Albert Sinatra & Antonio Carlos Jobim, célebre álbum em que “the voice” interpretou seu songbook.
Então, ele com 40, Clarice com 47 no momento da entrevista, publicada em 21 de setembro daquele ano na revista Manchete. Ambos, portanto, na plena maturidade de suas privilegiadas mentes. A primeira pergunta foi a mais óbvia: É terrível ter quarenta anos? Clarice recebeu uma resposta que dá o que pensar. O autor de “Garota de Ipanema” mas também da sinfonia que estreou na inauguração de Brasília, em 1960, começa dizendo que “tem um verso do Drummond que diz: ‘A madureza, esta horrível prenda…’ não sei, Clarice, a gente fica mais capaz, mas também mais exigente. Com a maturidade a gente passa a ter consciência de uma série de coisas que antes não tinha, mesmo os instintos, os mais espontâneos, passam pelo filtro. A polícia do espaço está presente, essa polícia que é a verdadeira polícia da gente. Tenho notado que a música vem mudando com os meios de divulgação, com a preguiça de se ir ao Teatro Municipal”.
Nesta altura, Tom inverte a conversa: “Quero te fazer esta pergunta, Clarice, a respeito da leitura dos livros, pois hoje em dia estão ouvindo televisão e rádio de pilha, meios inadequados. Tudo o que escrevi de erudito e mais sério fica na gaveta. Que não haja mal-entendido: a música popular, considero-a seriíssima. Será que hoje em dia as pessoas estão lendo como eu lia quando garoto, tendo hábito de ir para a cama com um livro antes de dormir? Porque sinto uma espécie de falta de tempo da humanidade – o que vai entrar mesmo é a leitura dinâmica. Que é que você acha?”
A resposta de Clarice Lispector reflete o pedido de todo grande artista, como também é Tom Jobim, em relação aos que se aproximam de suas criações: “Sofro se isto acontecer, que alguém me leia apenas do método vira-página dinâmico. Escrevo com amor e atenção e ternura e dor e pesquisa, e queria de volta, como mínimo, uma atenção completa. Uma atenção e um interesse como o seu, Tom”.
Ora, sentimos, em relação a estes formidáveis criadores de gênio em suas especialidades, que a cada ano que passa sem termos mais Tom entre nós sua música vai provocando em nós a sensação de que ela é cada vez mais necessária, cada vez mais decisiva para a música brasileira. Isso acontece desde os idos de 1994, são 26 anos de saudade, palavra tão brasileira que representa, na expressão de um poeta, a sensação da presença de uma ausência.
O Tom das parcerias com Baden Powell, Vinicius de Moraes, Edu Lobo, Chico Buarque é com certeza o mais conhecido do grande público. Vamos, claro, revisitar muitos de seus clássicos, da antológica Só tinha de ser com você, de 1956, a Piano na Mangueira, de 1992, e Samba de Maria Luíza, de 1994, ano de sua morte.
“Tudo que escrevi de mais sério e erudito fica na gaveta”. A frase soa como queixa. No entanto, como acentua Lorenzo Mammi num texto belíssimo publicado no Cancioneiro Tom Jobim, “é um sinal de passageira sabedoria da classe política brasileira que Jobim tenha sido encarregado de compor a música para a inauguração de Brasília, junto com Vinicius de Moraes. Com efeito, tanto a arquitetura de Niemeyer como a música de Jobim são expressões plenas da delícia do instante singular, em face da volúpia da repetição; da preservação do halo afetivo da palavra e do espaço, em face da busca da expressão precisa, cortante. Bossa nova, em face do jazz – não negação, mas complemento necessário. Caetano Veloso já disse que o Brasil ainda há de merecer a Bossa Nova. A música de Tom Jobim, então, é uma promessa que o Brasil fez ao mundo, e ainda não cumpriu”.
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