Sua produção não é grande, mas praticamente tudo vale a pena
Quando se pensa em César Franck (1822-1890), o compositor belga que viveu quase meio século em Paris, onde construiu toda a sua carreira musical, logo vêm à mente duas obras. A primeira deu-lhe popularidade ampla até hoje e a segunda era presença quase obrigatória nos recitais de 10 entre 10 pianistas até meados do século 20.
"Panis Angelicus" é uma melodia que ele incorporou em 1872 a uma missa a três vozes escrita doze anos antes, em benefício de uma família de artistas. O evento aconteceu na Igreja de Santa Clotilde, onde Franck era organista.
Todo estudante de piano passa pelo aprendizado do "Prelúdio, Coral e Fuga". Ela é austera e ao mesmo tempo libertária, no sentido de que não respeita o cânone aceito. Franck poderia ter feito sem problema um prelúdio e fuga à Bach. Mas, ao colocar no meio deles um coral, o compositor belga radicado em Paris enfureceu Camille Saint-Saëns, que além de compositor também era um extraordinário pianista. Saint-Saëns foi duro: "A execução fica desengonçada, incomoda: o coral não é um coral, a fuga não é uma fuga, pois perde a coragem assim que sua exposição termina, e continua fazendo intermináveis digressões". Ora, ele não entendeu que Franck tomou a mesma liberdade que um Beethoven, por exemplo, em relação às formas barrocas. Para que, aliás, fazer mais um pastiche de prelúdio & fuga, como os tantos que o próprio Saint-Saëns escreveu em sua longa vida? Por que os pianistas gostam tanto desta peça? E por que gostamos tanto dela? Ora, porque se trata de música de excepcional qualidade de invenção.
Dono de uma autocrítica desconcertante, Franck começou no domínio da música de câmara, com três trios para piano, violino e violoncelo aos 18 anos, quando ainda vivia com a família na Bélgica. Ele havia começado os estudos no Conservatório de Paris, mas o pai, interessado em explorar comercialmente o seu talento musical, quis voltar para a Bélgica. Revoltado, César trocou a família por Paris em 1846. Desmembrou depois um dos trios, o terceiro, e publicou-o como trio n. 4, opus 2, aconselhado por Franz Liszt. Foi, aliás, pela música de câmara que Franck se afirmaria como músico na plena maturidade, depois dos 50 anos de idade, com obras magníficas como o quarteto de cordas, a sonata para violino e piano e o quinteto para piano e cordas.
Sua obra-chave, sem dúvida, é a sonata para violino e piano. Escrita em 1886, é o primeiro exemplo de "forma cíclica" no domínio da música instrumental. Esta afirmação do compositor francês Vincent d’Indy traduz sua importância. Na sonata cíclica, escreve o pianista e musicólogo Charles Rosen, cada movimento é baseado na transformação dos temas dos demais movimentos. Ou seja, o tema inicial transforma-se mas sem perder suas características essenciais. Ela fica ainda mais importante porque Franck escreveu-a pouco antes de sua Sinfonia em ré menor, obra que aprimora a forma cíclica.
Ao lado da Sinfonia, as Variações Sinfônicas formam o par de suas obras orquestrais mais executadas nas salas de concerto. Foi composta em 1885 e sua estreia, em maio do ano seguinte, estabeleceu definitivamente seu prestígio como grande compositor. Em todo caso, pena que o reconhecimento público tenha vindo somente no finalzinho de sua vida. Ele morreria cinco anos depois, em 1890.
Dono de uma tenacidade incrível, ficou três décadas longe da música de câmara. Mas quando retornou a ela, em 1878/79, compôs uma obra-prima: o quinteto para piano e cordas em fá menor. Estudiosos e críticos costumam afirmar que este é o primeiro grande quinteto para piano e cordas da literatura francesa.
Emérito improvisador, tocou na Igreja de Saint-Jean François até 1857, quando tornou-se, até o final da vida, titular do famoso órgão Cavaillé-Coll, da Igreja de Sainte Clotilde. Sua obra para órgão é de excelente qualidade. Algumas coletâneas de peças avulsas foram publicadas entre 1859 e 1890. Como os Três Corais, obra que ele completou no ano de sua morte, 1890, e podem ser vistos como o seu testamento mais íntimo.
Durante este mês de agosto, de segunda a sexta-feira, de manhã no RádioMetrópolis, e à tarde, no Tarde Cultura, você vai reouvir as obras mais conhecidas de César Franck, mas também terá a chance de conhecer raridades belíssimas, como a música de câmara de sua juventude.
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"Notável organista Cesar Franck era também grande improvisador, o que fez seu conterrâneo Franz Liszt ficar muito emocionado ao ouvi-lo improvisar uma obra de Bach numa apresentação" ressalta o maestro Diogo Pacheco.
A Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo toca, sob a regência de Sir Richard Armstrong e com Angela Hewitt no piano, peças de Wolfgang A. Mozart e César Franck
Cesar Franck Panis Angelicus Jessye Norman (soprano) Royal Philharmonic Orchestra. Reg.: Alexander Gibson
Neste programa o poema sinfônico de César Franck baseado no mito grego Eros e Psiquê.