Um criador musical revolucionário, ele se alimentou de conceitos tão diversos como a teosofia, a sinestesia e as ousadias harmônicas
O compositor deste mês de abril na Cultura FM foi um homem apaixonado pelo piano. O russo Aleksander Scriabin, nascido em 1872, dedicou sua vida criativa ao instrumento e nele concentrou a maior parte de sua criação, em dezenas de estudos, prelúdios, mazurcas e sonatas.
Não seria exagero qualificar Scriabin como o resultado moderno de uma fusão entre Liszt e Chopin. O compositor russo, contemporâneo exato de Rachmaninov, fez do piano seu instrumento preferido. Mais do que isso. Fez do piano o veículo de suas criações mais importantes, como as grandes séries de Prelúdios, Estudos, Mazurcas e as dez sonatas. Foi professor de piano no Conservatório de Moscou entre 1898 e 1905, ou seja, entre os 26 e os 33 anos de idade. Neste período, fez várias visitas à Europa.
É curioso que tenha composto de modo frenético após concluir o período de estudos no Conservatório de Moscou, onde foi aluno de piano de Safonov, em 1903. Tanto que, entre julho daquele ano e fevereiro de 1904, escreveu cerca de 40 obras, incluindo a terceira sinfonia. Todas já refletem sua transição para uma concepção mística da música e do mundo, influenciada pela teosofia que conhecera na Suíça. Tendo como guru o filósofo Nietzsche e estimulado em sua caminhada filosófica por sua segunda mulher, Tatiana Schloezer, ele inaugura uma nova fase, que se radicalizará nos onze anos de vida que lhe restam – ele morreu em 1915, há exatos cem anos, no dia 27 de abril, em Moscou.
A palavra “Poema”, chave na criação do compositor, surge quando ele começa a aplicar à sua música os princípios da teosofia, pela qual se apaixonara nos anos 1890, quando viveu na Europa. Se na música sinfônica – como nos conhecidos Poemas do Fogo e do Êxtase, subtítulos de duas de suas sinfonias – e nas sonatas a palavra aparece com frequência, ele a aplica igualmente a peças curtas, que bem poderiam se chamar de prelúdios ou estudos.
Foi durante o segundo semestre de 1899 que Aleksander Scriabin compôs sua primeira sinfonia. Ele alugou uma dacha para passar o verão. Estava com 27 anos. Toda noite levava para a cama os manuscritos, só para anotar novas ideias que lhe vinham durante a noite. Sua estreia sinfônica foi ambiciosa. Possui seis movimentos, sendo que o último prevê solistas vocais e coro – como na Nona sinfonia de Beethoven. Em seus 50 minutos de duração, a sinfonia contém características que se manteriam em suas aventuras orquestra posteriores. Como a busca pela simetria entre as diversas partes. Cada movimento apresenta diversas relações temáticas com os demais. Talvez por isso a crítica moscovita atribuiu-lhe um franckismo excessivo, referindo-se ao princípio cíclico formulado pelo compositor belga radicado na França que influenciou muitos compositores na passagem dos séculos 19 e 20.
Aos poucos, no entanto, o misticismo e uma ambição desmedida de fazer uma música que abraçasse o universo, o cosmo, tomou conta de Scriabin. Ele também ficou muito conhecido por suas tentativas de unir cores e sons – sua última aventura sinfônica, "Prometeu", ou "O Poema do Fogo", é turbulenta, cósmica, mística, muito interessante e pouco conhecida. Por sua concepção musical e filosófica, é um prolongamento ou consequência natural dos anteriores "Poema Divino" e "Poema do Êxtase". Aqui ele utiliza o teclado de luzes, onde cada som corresponde a uma cor que é projetada no ambiente quando tocada. O efetivo orquestral é gigantesco. Madeiras e metais são ampliados, e além disso participam um órgão, duas harpas, celesta, coro misto e piano.
Do ponto de vista da estrutura musical, ele foi um revolucionário. Aboliu a construção dos intervalos convencional em terças. Adotou as quartas, e com delas construiu o que chamou de acorde místico, presente em suas últimas obras. Bastante influenciado por Chopin e Liszt na música pianística, e por Wagner na produção sinfônica, saturou de cromatismos sua escrita. Quando morreu, em 1915, era tão ou mais avançado do que um Arnold Schoenberg, por exemplo.
É esta figura enigmática que você vai acompanhar diariamente, no RádioMetrópolis e no Tarde Cultura, ao longo deste mês de abril, reouvindo suas obras mais conhecidas, como as sonatas "Missa branca" e "Missa negra", a peça para piano "Vers la flamme" e as últimas sinfonias. E também as criações menos lembradas mas igualmente interessantes, como a meia centena de prelúdios distribuídos no período onde morou na Europa.
E saber um pouco mais sobre seu envolvimento com a teosofia. A sonata n. 5, composta em dezembro de 1907, reflete o momento em que ele vivia uma revolução artística e pessoal, onde o misticismo e a teosofia o envolveram por completo. O grande Sviatoslav Richter afirmou que esta era a peça mais difícil do repertório pianístico. Como epígrafe da obra, Scriabin colocou o "Poema do Êxtase". Seus versos traduzem seu estado de espírito e postura diante da vida e da arte: “Eu vos conclamo à vida, ó forças misteriosas! – afogadas nas obscuras profundezas -- do espírito criador, temerosos rascunhos de vida, a vós eu trago a audácia”.
“Ama a vida com todo o teu ser e você será feliz como nunca. Não temas ser o que você quer ser. Não tenha medo de teus desejos. Não temas nem a vida nem o sofrimento. Não há nada de maior do que a vitória sobre o desespero. Não tenha medo, jamais, de desejar e de fazer o que você quiser... Em outras palavras, não tenha medo da liberdade!”. Estas palavras de Aleksander Scriabin funcionaram como seu lema na vida e na criação musical, principalmente a partir de 1901 e até o final de sua vida, em 1915.
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